A partir de hoje é maio. Só de pensar
que estamos no mês de maio meu coração
fica empolgado, sinto feliz. O verão está
próximo. No jardim as flores de morango estão
floridas. Penso sobre o pai que faleceu e acho esse fato uma
coisa místico. É realmente difícil de
compreender o que é morte, de uma pessoa deixar de
existir,
está muito além da minha compreensão.
Tenho muita saudade da minha irmã, das pessoas que foram
embora, das pessoas que já faz tempo não as
vejo. É…, acho que manhã
faz relembrar fortemente as pessoas do
passado, as
pessoas que já se foram. Esse sentimento é
tão forte que até parece cheiro de
takuwan (conserva de nabo) que invade toda casa de manhã,
é realmente duro de aguentar esse
momento.
Os dois meus cães, Jappy e Ká (eu
chamo assim
esse cão porque tenho pena dele. Pena em japonês
é kawaisô 可哀想 ) veio
correndo
brincando um com outro. Mandei os dois cães ficarem sentados
na minha frente e depois dei bastante carinho somente para Shappy. Os
pelos brancos e brilhantes do Shappy é lindo, em
comparação, os pelos do Ká
é sujo. Eu sei que Ká
está morrendo de vontade (se não
está quase chorando) de receber meus carinhos, eu sei que
ele é um cão deficiente, mas é
justamente por isso que
não gosto dele, é porque é um
cão coitadinho. Eu não suporto Ká
porque tenho
muita pena dele, e é por isso que maltrato ele. Ele parece
cão vila lata, por isso pode ser
apanhado per caçadores de cães
da prefeitura a qualquer
momento, como ele é deficiente nem
conseguirá
correr para escapar. Ká, vá logo embora para as
montanhas, pois
ninguém te ama, acho melhor você morrer logo.
Veja
bem, eu sou uma menina que faço maldade não
somente para o meu cão, mas também para as
pessoas. Gosto de causar problemas e provocar as pessoas. Realmente sou
uma menina detestável. Sento no engawa (縁側*1)
e acaricio
cabeça do Shappy, olhando para folhas verdes do jardim. Um
sentimento de desprezo a mim mesmo começa surgir e me deu
vontade de sentar no chão.
Sou patético mesmo. Me deu vontade de chorar, mas
não consigo. Se eu prender a
respiração até os meus olhos ficarem
vermelho talvez corra algumas lágrimas. Então
prendi a repiração, mas não deu certo,
não rolou nenhuma lágrima. Será que me
tornei uma mulher que nem tem lágrimas? (Que horror!).
Desistir de chorar e comecei fazer limpeza do meu
quarto. Fazendo a limpeza comecei a cantar a música
de
Tojin Okiti
(唐人お吉*2)
sem pensar muito. Quando percebi que estava cantando essa
música, parei de
cantar na hora e olhei em minha volta para ver se tinha
alguém
ouvindo. Caramba! É muito engraçado isso, pois eu
era apaixonada por músicas clássicas de
Mozart, Bach, etc., mas veja só, eu estava cantando uma
música popular! É hilário
mesmo!
Falando nisso, agora pouco também,
quando estava
levantando o futon eu disse “Yoisho!” e agora estava cantando Tojin
Okiti. Acho que estou pirando (enlouquecendo). Desse jeito, nem sei que
tipo de palavrão estou pronunciando quando estou
dormindo. Senti até medo! Mas ao mesmo tempo me acho
engraçada. Parei de varrer e comecei a rir
sózinha.
Coloco roupa debaixo novo que terminei de fazer
bordado ontem. Na
parte de busto bordei uma pequena flor de rosa com linhas brancas. Se
eu vestir uma blusa por cima ninguém
notará que
tem esse pequeno bordado, mas eu sei, e isso me deixa
orgulhosa. A mãe está muito
ocupada por
causa de proposta de casamento (縁談=
endan) de alguém e saiu bem
cedo da casa. Ela sempre foi assim, desde que eu era
pequena, ela gosta de se dedicar para outras. Eu
já até me acostumei com isso, mas fico admirado
com a disposição que ela tem,
pois não para nenhum momento, sempre
está fazendo alguma coisa. Ela fala que o pai
sempre foi estudioso, por isso, ela diz que quer se dedicar
também como seu falecido marido.
Bem, apesar que meu pai
não era muito chegado com a vida social, mas a minha
mãe é oposta do meu pai, gosta de se relacionar e
tem ótimos relacionamentos com as pessoas. Os dois eram
diferentes, mas tinham muito respeito um com outro. Para mim, acho que
eles não tinham essas coisas terríveis
de casal,
só tinham coisas belas e viviam felizes. Puxa, quem sou eu
para
avaliar meus pais? Deixa de ser impertinente!
Coloquei a penela de sopa de misso no
fogão na
cozinha e até esquentar a sopa fiquei sentada olhando para o
bosque em frente da casa vagamente. De repente senti numa
fração de segundo, uma
sensação estranha que, eu sempre fiz e
farei a mesma
coisa – ficar sentada na cozinha esquentando a comida e ficar pensando
as mesmas coisas – no passado, presente e futuro.
Sinto esse tipo de
sensação de vez em quando, as vezes quando estou
conversando com alguém sentada na sala. Meu olhar fica
fixado no canto da mesa e não se movem. Só a
minha boca está movendo soltando palavras. É
nessa hora que as vezes sinto essa mesma
sensação. – acho que é isso
mesmo que acontece. Algum dia, eu sentirei a mesma coisa, terei a mesma
sensação várias vezes daqui para
frente também.
Mesmo caminhando numa estrada do
interior
(que eu nunca tinha andado antes), terei a
sensação que “eu já andei pela essa
estrada”. Na beira da estrada eu pego algumas folhas de
feijão e também acharei que já fiz
isso algum dia. E sei que presentirei que isso se repetirá
por várias e várias vezes também no
futuro. Eu acredito
nisso.
Houve também um dia que eu estava
tomando banho e
olhei sem querer as minhas mãos e pensei que faria a mesma
coisa daqui a alguns anos quando eu estarei tomando banho e
olho para as minhas mãos.
Caramba! Isso é
realmente muido medonho! Tive uma tarde também que quando
estava passando o arroz cozido da panela para ohitsu (recipiente de
madeira para arroz cozido), surgiu uma inspiração
– puxa, talvez essa expressão
é exagerada – passou
algo no meu corpo, como posso explicar, era relâmpago de
inspiração filosófica. Essa
coisa me atingiu
de cheio, a minha
cabeça, meu coração, tudo e
senti que fiquei
tudo
transparente, parecia que adquiri uma certa tranquilidade, semelhante
ao que se sente quando se chega a um certo final, senti que
algo
estava
me ensinando a viver com naturaridade, como tokoroten*3 é
exprimido
silenciosamente sem provocar nenhum barulho, viver conforme as ondas,
,
sem resistência com
flexibilidade, com leveza e beleza.
Bem, francamente dizendo,
naquela hora nem tive cabeça para pensar em filosofia, pois
você já pensou, ter uma
premonição de viver em silêncio como
gato ladrão, não é nada
agradável, tive muito medo daquilo. Acho que se aquela
situação continuasse por longo tempo, teria uma
divina possessão, eu seria um Crito. Cristo? Mas um Cristo
mulher? Que horror!
Bom, como eu não trabalho e tenho tempo
de
sobra, fico ouvindo monte de coisas todos os dias, de
várias pessoas, e
isso faz com que a minha cabeça fica cheia dessas
informações. Porém, como
não consigo me organizar isso, a mina sensitividade fica
à flor da pele e pode ser que as
informações
não processadas na minha cabeça viram monstros e
começam a flutuar em minha volta!
Vou tomar o café da manhã
sozinha na
sala de jantar. Como pela primeira vez o pepino neste ano.
Acho que a
cor verde do pepino pronuncia a breve chegada de verão. Na
cor verde do pepino de maio eu sinto uma sensação
de vizia, dor, irritação e
melancolia. Quando eu como sozinha
na sala de jantar, me dá uma tremenda vontade de sair para a
viagem, quero pegar um trem e partir.
Pego jornal e leio. Tem fotografia de Sr. Konoe.
Será que ele é um bom homem? Eu não
gosto de uma pessoa que tem cara igual ele. O que estraga nele
é a testa dele. Quando leio o jornal, acho mais interessante
ler propaganda de livros. Como o jornal cobra 100 yens, 200 yens por
uma linha de propaganda, quem pretende colocar o anúncio no
jornal tem que quebrar a cabeça para conseguir criar frases
de anúncio que atraia olhar dos leitores. Por isso, as
frases de propagandas são em geral, muito bem elaboradas.
Acho que não deve haver no mundo inteiro, frases que custa
tanto como frases de classificados do jornal. Se pensar assim, fica
mais interessante ler os classificados.
Termino de tomar café da manhã, tranco
a porta e saio da casa para ir à escola. Eu acho que
não vai chover hoje, mas estou carregando a
guarda-chuva que minha
mãe me deu ontem, pois queria andar com ela. Essa
guarda-chuva,
a mãe me diz que ela usava
quando era jovem. Estou um pouco orgulhosa de andar com uma
guarda-chuva “interessante”. Me dá vontade
de andar pelas ruas de Paris com
essa guarda-chuva. Eu acho que, quando terminar a guerra que
está tendo agora, esse tipo de guarda-chuva
antiga e bonita voltará a fazer moda. Eu
acho que para essa
linda guarda-chuva,
combina bem um chapéu bonnet. Fico me
imaginando eu usando um vestido longo de cor pink com gola bem aberta,
usando longas longas de seda com bordados pretos e na
cabeça
um chapéu bonett de aba larga com uma linda flor de violeta.
Sim, eu irei a Paris na época de folhas verdes
(junho) para almoçar num restaurante bacana. Fico sentada
numa mesa com queixo levemente apoiado com a mão
e observo as pessoas que passam
pela calçada. Daí,
alguém bate de leve no meu ombro, começa tocar a
“Valsa de Rosas”… Ah, isso é muito
engraçada, pois na realidade eu só estou com essa
guarda-chuva velha. Eu sinto pena de mim mesmo, estou-me parecendo
com aquela pobre menina de “A Pequena Vendedora de Fósforos”
(obra de Hans Christian Andersen). Pobre vendedora de
fósforos, que tal arrancar algumas ervas daninhas antes de
ir à escola?
Então, resolvo arrancar um
pouco de ervas daninhas que tinha crescido perto do portão
da casa. Com isso, acho que estou retribuindo a mãe. Mas,
por que será que há ervas daninhas que
dá vontade de arrancar e outras que quero deixar ali sem
mexer, sendo mesma erva daninha? As ervas que acho que são
graciosas e as que não são, são
iguais, não tem nada de diferente, mas vejo nitidamente a
diferença entre as ervas daninhas adoráveis e as
que me provoca ira. Acredito que não há
explicação lógica para isso, acho que
o “gosto de mulher” sempre foi duvidoso mesmo.
Após arrancar as ervas daninhas por uns dez
minutos, fui em direção a ponto de
ônibus. Andando pelo estreito caminho no meio do campo de
plantação, senti vontade de desenhar. Seguindo o
caminho, entro na floresta do templo
xintoísta. Eu descobri esse caminho que corta o caminho.
Olho para chão e vejo
brotinhos de trigos de uns 5 centímetros de altura que havia
nascido aqui e acolá. Logo percebi que os soldados
do exército passaram novamente este lugar.
No ano passado também passaram muitos
soldados e cavalos por aqui e descansaram nesta área do
templo. Depois que os soldados
foram embora, haviam nascido também alguns brotos
de trigo aqui e
alí, igualzinho agora. Mas os brotos de trigo não
cresceram
mais que isso. Esses trigos eram ração de cavalos
que devem ter caído no chão. Mas como a
floresta
é escura, não bate o sol direito,
os brotos de trigos morrem logo sem poder crescer.
Coitadinho dos trigos.
Saio do caminho do meio da floresta e
começo
andar na
rua. Quando estava andando perto da
estação de trem, fiquei junto com um
grupo de operários que estava indo na mesma
direção. E o pesadelo omeçou. Esses
caras
começaram a mexer comigo, falando baboseiras. Eu
fico perplexo e nem sei como reagir. Tenho vontande
de
andar rápido e deixar para trás esse
operários imbecis, mas para fazer isso, eu tenho que
passar no meio do grupo e não tenho coragem para fazer isso.
Mas ficar parado e deixar eles irem na frente requer mais coragem, pois
acho que essa atitude significaria desprezo para com
eles e pode ser que eles fiquem
bravo comigo. Fico morrendo de vergonha e me deu vontade
de chorar. Então eu resolvi rir para operários,
para eles não percebam que eu estou quase chorabdo.
E
depois segui atrás deles com uma pequena
distãncia, andando bem devagar. Bom, nada de pior aconteceu,
mas fiquei com tanta raiva deles, mesmo depois que tomei o trem. Quero
me tornar uma mulher forte e pura que não seja abalado com
coisas assim.
Achei uma vaga no banco próximo
à
porta do trem, resolvi sentar, então coloquei meus materiais
da escola na vaga no banco e ia sentar depois de arrumar as dobras da
saia. Mas, que coisa, um homem de óculos empurrou
meus
materiais da escola para lado e sentou na minha vaga!
- Me desculpe, mas esse é meu lugar.
Ele, apenas deu uma risadinha, abriu jornal e começou a ler,
sem se importar comigo!
Bom, se pensar direito, não dá para
saber quem é mais cara-de-pau. Talvez seja eu. Sem outra
opção, eu coloquei a minha guarda-chuva e
material escolar no bagageiro do trem. Depois me segurei numa
alça do trem e fiquei lendo a revista em
pé,
como faço sempre. De repente surgiu um pensamento.
Se tirar a leitura de mim, o que seria de mim, que
não tenho quase nada de experiência da
vida? Acho que ficarei muito trite, pois eu sou apaixonado
por livros, sigo fielmente as dica e os conselhos que
estão nos livros. Eu leio um livro, imediatamente
me empatizo e
concordo com a opinião e idéia exposto
nele, e
coloco na prática o que eu li no livro. E
quando leio um outro livro, sem pensar duas vezes, eu
abandono o que aprendi no livro anterior e agarro
na idéia e opinião do novo livro. E
não
estou nem aí, eu faço o que eu quero. Acho que
possuo um dom especial de ficar com as idéias dos outros e
adaptar para mim! Mas essa minha “esperteza” e “ardileza” as vezes me
faz detestar de mim mesmo.
Se eu repetisse todo dia os mesmos erros e continuasse
passando vexames com isso, talvez eu aprenda e me amadureça.
Porém, é bem provável que, mesmo
quando cometo os erros, eu devo arranjar desculpa espafarrada para me
justificar, fazendo até teatrinho para enganar
outros.
(Ih, parece que isso também eu já li em algum
livro…)
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